por Roberto Perche de Menezes - robertoperche@terra.com.br
"Surpreendi-me um pouco
quando meu padrinho convidou-me para assistir uma palestra sobre Evolução
Espiritual: "Só de curiosidade", disse ele.
Eu perdera meus pais ainda jovem
e meu padrinho, durante um período importante da minha vida, fora um ponto de
referência seguro. Lembro quando levou-me, pela primeira vez, a um pub. Ele não
era de beber, mas passamos uma noite agradável lá. Algum tempo depois percebi a
lição daquela noite: era possível se divertir em um pub sem sair de lá
embriagado.
Por isso aceitei o convite para a
palestra, embora achasse que não era a minha praia. Lá percebi que não era
curiosidade dele. Várias pessoas o cumprimentaram e trocaram ideias sobre
assuntos, para mim, pouco comuns: despertar de consciência, portais e planos
astrais e outras coisas. O que me causou certo incômodo é que, embora eu nunca
tivesse lido ou conversado com alguém sobre aqueles temas, eles de alguma forma,
me pareciam estranhamente familiares.
Algum tempo depois ele me
convidou para participar de reuniões, informais, que ocorriam às terças-feiras.
Ali se trocavam ideias, informações, experiências e impressões sobre
autoconhecimento e outros temas que tinham relação com a palestra a que eu
tinha ido. Relutante a princípio, fui algumas terças às reuniões e encontrei um
ambiente agradável, onde fiz amigos e aprendi coisas novas (novas?). Porém,
depois passei a falhar na frequência, até que após algum tempo parei de ir, sem
ter dado nenhuma satisfação a ninguém.
Numa noite de fim de outono,
quando o inverno londrino já se fazia sentir, estava sozinho em casa quando a
campainha tocou. Olhei. Era meu padrinho. Me senti como um garoto pego fazendo
alguma coisa errada. Abri a porta, ajudei-o a retirar o casaco. Ele me deu um
abraço carinhoso, mas não disse uma palavra. Convidei-o para sentarmos defronte
a lareira que já estava acesa. Nos acomodamos e me preparei para um puxão de
orelhas. Mas ele estava absorto olhando para a lareira. Ficamos alguns minutos
em silêncio olhando o crepitar das brasas.
De repente ele se levantou, pegou
o atiçador e afastou um pedaço de madeira do centro da fogueira. Pendurou o
atiçador e sentou-se novamente. O pedaço de lenha afastado da fogueira, manteve
durante algum tempo seu calor e brilho. Depois, lentamente, começou a apagar.
Antes que apagasse por completo, meu padrinho levantou-se e com o atiçador
reintegrou-o à fogueira. Incorporado ao fogo central, sua chama e seu brilho rapidamente
se reavivaram. Feito isso, levantou-se, deu-me outro abraço afetuoso e sem
dizer uma palavra, saiu.
Na terça-feira seguinte voltei a
frequentar as reuniões. Com o tempo e com o progredir natural decorrente do
aprendizado, entendi inclusive o porquê da minha resistência inicial à
evolução.
Entendi o significado amplo de
expressões como "somos todos um" e de textos como: "... nenhum
homem é uma ilha. Nenhum ser humano subsiste por si próprio. Da mesma forma que
quando o mar arranca um pedaço do promontório e o continente como um todo se
diminui, do mesmo modo, quando um homem morre, a humanidade como um todo se
diminui, posto que fazia parte do gênero humano..." "Jamais pergunte
por quem os sinos dobram. Eles dobram sempre por ti...".
Todos merecemos uma segunda
oportunidade."